O mundo se curva

J. R. Guzzo
 
Se há uma coisa que o Brasil tem de sobra hoje em dia são os títulos de mais, melhor ou maior do mundo. Temos, segundo o governo não nos deixa esquecer nem por um minuto, o maior programa de distribuição de renda do mundo — ou, pelo menos, é assim que a máquina de propaganda oficial descreve o Bolsa Família. Ela nos garante, também, que nenhum país do mundo é melhor que o Brasil no combate à fome. Os poços de petróleo brasileiros no mar são os mais fundos do mundo, e o Brasil é o país que mais ganhou Copas no futebol mundial. O Amazonas, segundo medições recentemente concluídas, é o maior rio do mundo. Somos os maiores produtores mundiais de uma porção de coisas úteis, e temos, na Amazônia, a maior floresta tropical do mundo. O Brasil tem mais água doce, à vista e debaixo do chão, do que qualquer outro país do planeta. A isso tudo se pode acrescentar, depois dos bem-sucedidos esforços feitos de 2003 para cá, outro primeiro lugar, não muito lembrado: o Brasil é hoje o país mais governável do mundo. Desde que o PT e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva assumiram o governo da República, criou-se por aqui algo chamado “governabilidade”, um sistema de administração da vida pública pelo qual quem está no governo fica 100% a favor dos políticos — ou, mais exatamente, fica a favor de tudo o que interessa ao governo, mesmo quando teriam de ficar contra. O resultado é um país fácil de governar, sem nehum dos inconvenientes que tanto atrapalham a vida das duas partes, políticos e governo, em outros países menos afortunados: oposição que se opõe, obrigação de prestar contas à oponião pública, perda de mandatos, dificuldades para fazer negócios, problemas com o Código Penal e outras chateações desse tipo. Ser “governável” é isso — e nisso o mundo todo, mais uma vez, se curva ante o Brasil. A governabilidade brasileira, na sua encarnação atual, é um legado direto do ex-presidente da República. Ele descobriu bem depressa que a maneira mais eficaz de governar o Brasil sem ser incomodado era juntar-se à massa de políticos que, com uma cara ou outra, se elegem, se reelegem e mandam há décadas na vida pública do país — e que não iriam mudar de conduta só porque Lula foi eleito presidente. Essa gente, até então, sempre foi descrita por ele como uma desgraça nacional, pior que as dez pragas do Egito — ficará registrada para sempre, por exemplo, sua definição do Congresso como um amontoado de “300 picaretas”. Mas, antes mesmo de completar seu primeiro dia na Presidência, Lula já tinha aderido de corpo e alma à massa de escroques que tantas vezes denunciara: melhor viver em paz com eles do que passar seu governo todo trombando com o sistema “que está aí”. Formou-se então a “base aliada”, que até hoje não se desfez mais, e nem parece perto de se desfazer. Do governo ela recebe apoio completo para tudo aquilo que realmente lhe interessa: furtar, receber propinas e comissões, ocupar cargos rentáveis, entre os 25 000 que o governo tem a oferecer na máquina pública, ajudar a vida de empresas de amigos, familiares e financiadores, empregar parentes, canalizar dinheiro público para suas “ONGs” e por aí afora. Em compensação, a “base” dá ao governo as mesmas coisas que recebe dele. Até hoje, salvo um ou outro contratempo, tem funcionado muito bem — quer dizer, muito bem para os interessados. Lula e o PT têm demonstrado uma lealdade impecável aos aliados, principalmente quando são pegos roubando, mesmo nos casos que o crime é filmado; até hoje não falharam nem uma vez. Os aliados retribuem exatamente na mesma moeda. Houve algum ruído, mais recentemente, no bom andando das operações feitas nos dois lados do esquema. Ministros e altos funcionários foram demitidos ou precisaram pedir as contas por envolvimento em episódios de corrupção e, por causa disso, a “base aliada” estaria “insatisfeita”, segundo deram a entender em público diversos dos seus integrantes. Ficou esquisito. Não deveriam eles, na condição de aliados do governo, aplaudir a “faxina” que a presidente Dilma Rousseff estaria fazendo? Ou teriam ficado aborrecidos por serem a favor da roubalheira, mais do que a favor do governo? Aparentemente, tudo não passou de um mal-entendido temporário — pararam as demissões e parou a choradeira. A mola que chia primeiro, como bem se sabe, é sempre a primeira a receber graxa. Foi mais uma importante vitória da governabilidade.

Fonte: Revista Veja 14/09/2011

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