GOLPISMO MIDIÁTICO

EDITORIAL - ZERO HORA (RS) - 22/9/2010
Estimuladas pelo emocionalismo eleitoral e por manifestações sectárias do presidente da República, lideranças sindicais e de movimentos ditos sociais, com o respaldo de partidos governistas, estão anunciando para esta quinta-feira um ato público contra o golpismo midiático. A manifestação, que é legítima na democracia que os brasileiros sensatos defendem para o país, envolve também uma evidente ameaça às liberdades constitucionais, em especial à liberdade de expressão. Quem é a mídia golpista? São os meios de comunicação independentes que estão noticiando irregularidades no governo, apropriação indébita da máquina pública por apadrinhados políticos do poder e por seus familiares, evidenciada no explícito tráfico de influência que provocou recentemente a demissão da ministra-chefe da Casa Civil? A imprensa pode cometer equívocos, como qualquer obra humana, e pode ser criticada por determinada reportagem ou mesmo por alguma posição editorial. Mas deve ter também, como atribuição democrática, a representação da sociedade para ver e denunciar as irregularidades e as distorções do poder público em todas as esferas.
Evidentemente, denúncias como as que vêm sendo publicadas nas últimas semanas podem trazer prejuízo político para quem está no governo e para os candidatos e militantes da chamada situação. Mas este é o preço da democracia. Imprensa digna é a que denuncia e não a que se alinha submissa ao poder, abandonando seu compromisso com os interesses da população. As mesmas vozes que se erguem contra o papel da imprensa nos atuais episódios, a que qualificam de golpista, são as que elogiam quando as denúncias atingem seus adversários políticos. Assim, para esse pensamento sectário e deformado, a imprensa cumpre seu dever quando denuncia o mensalão do DEM, mas é antidemocrática quando descobre o tráfico de influência exercido na Casa Civil da Presidência. O ex-ministro José Dirceu chega ao cúmulo de ver na atitude fiscalizadora da imprensa o pecado de abusar do direito de informar, algo que soa como autoritário. Para corrigir tal pecado, propõe a receita embutida numa frase que eufemisticamente encobre a tentativa de controlar a imprensa livre: A democratização dos meios de comunicação.
O presidente da República, iludido pela sua estrondosa popularidade, corre o risco de manchar sua biografia de democrata ao avalizar tais gestos e ao respaldar o patrulhamento de conotação fascista, patrocinado por lideranças incapazes de conviver com a crítica e com ideias contrárias. O golpismo não está no exercício da liberdade de imprensa, insumo indispensável para qualquer democracia, mas na tentativa de silenciá-la. As frustradas tentativas de impor controles sobre os meios de comunicação, reiteradamente propostas nos últimos anos, recendem ao condenável modismo antidemocrático que vem sendo praticado na Argentina e na Venezuela.

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